domingo, janeiro 31, 2010

Imperialismo

*foto tirada na estrada em "movimento"


A mão pesada cai como ferro nas cabeças de um severo sentimento manso
sacada com punhos fechados de uma raiva adulterada no chão de atalhos
humanos falhos, na ganância de um império faminto sem satisfação
na opressão velada em um riso enfadonho sempre risonho em destruição
sobre a beleza natural das coisas criadas em feridas abertas sem cicatrização
mercenários com mais sangue quente na cara que no corpo entorpecido de capital
estupidez, de proporções enveredadas na cegueira fabricada de vantagem
encapada com a couraça normal de um tecido vigilante diante da imagem da certeza
de posse, na terra de ninguém.


Rafael Belo (Folha de Outono) 11h54, 24 de janeiro de 2010.

sábado, janeiro 30, 2010

Nuvens Vertentes

* foto tirada exatamente assim, enquanto virava omundo de ponta cabeça

Chora chuva pelas lágrimas vertidas das nuvens coloridas de outrora
Chova guardada na nascente de um dia novo cavalgando pelo lume da aurora
Chore até um outro alvorecer, até ser orvalho do sereno do luar

Uma manha limpa vertendo dos olhos,
que revigorem,
o olhar,
Guardarei tuas pérolas choradas como uma praia de seus grãos de areia
Onde ateia a flâmula ardente e repousa a vida contínua

Toda dor chove um dia por fora ou vive a chover por dentro
Um sofrimento

Natureza humana de sentir e esconder o que sempre está lá
A incomodar tantos fingimentos, nos labirintos dos esconderijos lamacentos

Até raiar uma luz, rolando das nuvens nubladas do coração.

17 de janeiro de 2010, Folha de Outono (Rafael Belo) 19h52.

segunda-feira, janeiro 25, 2010

Receio da certeza

Por Rafael Belo
*foto tirada na volta pra casa enquanto o dia nascia


Estava tudo certo, mesmo não combinado consigo e com ninguém. Surgem em pensamentos era isso, era essa. Nem precisava a conversa. A certeza estava lá antes da gente. Precedeu o momento, precedeu a pessoa. Há uma magnitude levando a mente e a alma a se atrair por aquela força magnética percorrendo. Mas, há um medo de comparações próprias. Há um medo de insegurança constrangedora. E na nossa sapiência descomunal, decidimos não errar não se ferir. E o momento passa e a pessoa continua.

Penso neste receio da certeza dentro da nossa mente, a contradizer a certeza repleta de todos os sentidos do corpo. E ainda dizem não sermos loucos. Nossa! Deixamos tantas vidas para trás e muitas vezes ficamos na mesma. Como se não houvesse evolução. Como se universo não fosse uma conspiração silenciosa voltando no momento certo, para o não combinado, para as precedências involuntárias a baterem e acelerarem o coração sem tempo.

Quantas vezes não foi vista “aquela pessoa” e houve uma pausa no mundo. Se foram poucas ou nenhuma há bons amigos e psicólogos que podem ajudar... É como se tivéssemos algo faltando uma peça “do nada a perder” a impulsionar a engrenagem sem receio. Poucos se arriscam na vida e é tão arriscado viver. Me parece ser esta a tal liberdade. Seguir em frente, saber “voltar atrás” e saber aceitar os erros. Seria esta a perfeição? A perfeição é algo infundado, já que errar é que nos faz tão humanos.

Receio ter de dizer isto, mas receios devem ser recheios feitos trocadilhos para aceitar o convite de adentrar aquele olhar. Não é preciso dizer se apaixonar até que reticências tragam um ponto final e não venha a se transformar em Amor, afinal. Sem desespero. As certezas são temporárias, menos a final, mas até lá não é são duvidar de nós mesmos. Que o receio recheie, mas não seja o sabor.

quarta-feira, janeiro 20, 2010

Rostos sofridos


*A foto eu tirei no meu retorno enquanto o sol nascia para dar luz a um novo dia. Alvorada aquarela!

Por Rafael Belo

Crianças nas ruas. Descalças, algumas sem camisetas. Há algo diferente nos olhares. Um vazio, uma necessidade desconhecida para elas. Seus pais têm rostos sofridos, às vezes reclamam da vida, mas por hábito dizem estar “tudo bem”. É uma situação de vida onde falta cidadania, esta tão distante como o bairro asfaltado ao lado ou o centro há alguns ônibus dali.

Eles estão acostumados, assim como muitos de nós, a viver à margem de tudo. Privados de direitos. Olhados com olhos tortos e caminhos desviados pelos mais “abastados”. São rostos velhos salientes cheios de marcas profundas feitas pela navalha cega da vida, antes da juventude chegar. Parecem fadados a viver sempre, nas situações precárias limites onde estão.

Dizem ser futuros marginais aqueles pequenos. Mas, alguns infelizmente já o são. Vejo marginalizados, isto sim. E neste ano atravessadores para políticos vestidos de caráter duvidoso e lascas de madeira e promessas e pão e circo e entretenimento vazio e assim se atrofia a humanidade.

Nas primeiras vezes, fui até as margens da cidade para tratar de tiroteio, brigas de gangue, violência, descaso, buracos, crateras, alagamentos... E há sempre um traço de sofrimento nos rostos curtidos. Enganamos-nos ao comparar: “São iguais mulheres bonitas. São invisíveis. Ninguém vê ou se importa se há vida inteligente por ali”. Já na região central ou com mero abastecimento adequado de água, luz, esgoto e coleta de lixo a face dos assaltados é de ofendidos e alheios a este mundo. No entanto quem tem culpa da dores e alegrias do mundo?! Heim?

Mas, o mais triste é ver as crianças vivendo e sobrevivendo no meio e do lixo. Para quem, como nós, não está largado a própria sorte. Respirar ali é sinônimo de passar mal, de ânsias, de lágrimas... Os menores agressivos feitos animais selvagens sem contato com a civilidade, sem carinho, sem qualquer afeto, vivendo no desamor, usados e abusados já estampam na testa, conforme a visão de muitos, a palavra “perdido”, “drogado” “aprendiz de criminoso”. Palavras cruéis de crianças mostrando os dentes e avançando nos carros ousados ao passar por onde não “lhes diz respeito”.

Vi esta realidade nos poucos lugares em que trabalhei e fotografei nesta minah apaixonada vida jornalística, depois voltei e volto pra casa sem esquecer mais daqueles rostos sofridos. Já no caminho penso um pouco como Carlos Heitor Cony: “E ninguém toma nenhuma providência!?”. Mas eu é que não vou desistir e fechar os olhos e esquecer. Vou insistir para que tomem - não cicuta ou o veneno do trágico amor de Romeu e Julieta, mas as providências.

segunda-feira, janeiro 18, 2010

Retornos


(foto tirada da saúva no meu novo velho quintal)
por Rafael Belo

       Veio um momento silencioso há alguns meses do fim deste último ano. Era hora de voltar como um experimento eternamente inacabado. Mas, o instante preciso ainda rodava pela estrada para propor meu retorno. Vinha ao meu encontro. Mal sabia ter eu a decisão tomada, àqueles que vinham. Já era hora, algo me dizia. Eu balançava a cabeça e imaginava as pessoas voltando ao meu círculo tão amplo. Mais uma vez a estrada me chamava. Foram dois anos. Silenciosamente pensava. Seria esta minha casa? Sim... Minhas raízes aéreas sempre voltavam para “o” lugar.
     Mais alguns pontos seguidos de reticências na minha vida se reiniciando constantemente. Sorria com a certeza da decisão tragada feita um copo de aguardente envelhecida. A arder em uma mistura de calor e frescor, acendendo os olhos como um ânimo injetado de vida sem qualquer rotina. Minha vida. Passando pelas entradas para mais adiante fazer retornos. Tantos livros lidos e tanto tempo longe da “vida inteligente” refugiada nos campos da blogsfera.
     Começar do zero é o refrão da minha balada mais tocada. Mas, desta vez permiti enfim, a adoção legal da minha pátria regional e uma ligeira troca de música. Mesmo dizendo aos ventos não ser de lugar nenhum e ser de todo lugar, meu coração insiste em ser desta Cidade Morena. O meu refúgio negligente com o mundo de costas, porém com mãos estendidas. Esta Campo Grande, neste Mato Groso do Sul acaba por ser para onde volto.
     Agora é 2010. Neste momento quando volto a postar meus olhares do avesso. Quando deixo a mudez completamente falando pelos cotovelos. Minha virada sem posses a não ser as palavras aleatórias por acaso formando algo compreensível, depois de tantos livros empilhados na ponta da mente. Após uma nova evolução, nem sempre dar um passo para trás significa o mesmo retorno. Estou de volta.