terça-feira, abril 30, 2013

Distúrbio da Dependência Virtual



Distúrbio da Dependência Virtual
por Rafael Belo

Há um chorume e muito chororô nas redes digitais corroendo a imagem e ampliando as aparências com a eloquência de um mudo por estupefação. A carência é tão assombrosa que as ilhas de isolamentos formam seus próprios arquipélagos e povoam o mundo virtual como uma distorção emocional nunca antes vista nem em pornochanchadas. Há os otimistas ao extremo e os depressivos a tal fundo a parecer postagens do além. Um mundo vivo e mutante onde a conexão é em tempo real e o tempo todo. É o novo mal dos séculos e séculos: o Distúrbio da Dependência Virtual.

A síndrome dos dedos ansiosos faz parte deste male. Então é um quê de postar fotos, compartilhamentos, curtidas... Ah, as curtidas... O desejo de ser desejado, de ter o “brilhante” pensamento bem quisto por outrem, de todos comentarem o fato público de termos ido ao banheiro, estarmos comendo, com fome, tomando banho (ah, vai tomar banho...), e dezenas de inutilidades da rede feitas como se fôssemos tolos adolescentes apaixonados pela primeira vez ao desligar o telefone: desliga você primeiro amor, ah não desliga você, então vamos desligar juntos 1, 2, 3, aaaah você não desligou...

Nossos dedos desesperados percorrerem fazem o cursor deslizar páginas e págians para sabermos o quê as pessoas estão fazendo, o quê não estão o que farão... Mas algo que ainda não está em consenso é a marcação. Não a cerrada ou a disfarçada, a das frases e imagens. Uns reclamam por horas (o que equivale a anos no mundo virtual...) por não terem sido marcados. O céu desaba, o mundo acaba e lá vem o melodrama. Outros por serem marcados. Desaba o céu, acaba o mundo, a casa cai e lá vem mais uma novela... Esse novo distúrbio é uma grande rede física tornada virtual pela (r)evolução tecnológica.

“Saímos” da pequenez das fofocas, intrigas, disputas desonestas físicas e face a face para vigiar e espalhar feito um efeito viral nas redes digitais por horas e horas infrutíferas neste espaço tão bebê ainda desconhecido. Covardemente nos expomos e expomos outros enfocando em uma lupa todas as nossas carências em um grande caldeirão de temperos com horrendas expressões faciais. Estas efemeridades mudam instantaneamente como as celebridades frutas: dependem das estações.

É claro que estamos focando a parte podre, mas tanto a podre quanto a madurinha tateiam às cegas - por estupefação - nesta turbulência pronta para nos sucumbir as consequências.

sábado, abril 27, 2013

Miniconto - Sem aviso prévio


Miniconto - Sem aviso prévio
por Rafael Belo

Mais um acidente a atrasando. Outro no cruzamento da Antônio Maria Coelho com a Bahia. Já sempre atrasada sem motivo, ela estava mais uma vez impaciente. Buzinava como se adiantasse, acelerava como se resolvesse, enviava mensagens reclamando e ligava tentando se explicar. Amaldiçoava os motoristas irresponsáveis que a prendiam no trânsito. Decidiu descer e caminhar quase mil metros para tirar satisfações. Borbulhava como se nunca tivesse tomado uma antirábica e tivesse dormido em festa com todos os morcegos da cidade.

Eles vão ter que me pagar em dinheiro cada minuto de atraso. Onde já se viu parar o fluxo desta forma?! Por que não saíram mais cedo...? Estão me atrapalhando... Devem ter furado o sinal. Mas também onde estão os fiscais? Detran, Agetran, Ciptran... Com aquelas roupas ridículas...? O mesmo blablablá... Coloque o cinto, dê seta, não avance o sinal, seja gentil mo trânsito, dê vez aos pedestres.... O quê vocês estão olhando se nem sabem se vestir bem? Ah, aposto que queriam ter minha coragem de ir até lá e... Será que tranquei o carro?

Mal se deu conta que já estava sobre o acidente. Uma batida fatal que acabara de acontecer entre duas caminhonetes. Infelizmente eram duas mães com suas filhas. As meninas estavam feridas... Quando parou de olhar adiante e viu o que se passava começou a tremer. Era a primeira a chegar. Sentiu um cheiro queimando seu nariz. Olhou para o sangue misturado com gasolina... Então, enxergou alguns rapazes carregando cuidadosamente as duas meninas sobreviventes. Tudo muito rápido. Forçou a vista para ver se as mães se mexiam. Olhou de um carro para o outro incrédula. Uma estava misturada com as ferragens e vestígios de celular como extensão da mão. A outra, incrivelmente, estava com um cigarro ainda aceso e... Buuummm....  ! Tudo foi pelos ares...

O quê é isso?! Mas... Obrigada! Muito obrigada. Ah, me desculpe o abraço. Você me salvou e mais uma das meninas, certo? Que situação terrível! Estou chocada... Estou... Sangrando?!  Quê cena de guerra é essa...

Não quis saber de socorro. Assim que a distração tomou conta, correu de volta para seu carro. Estava batido dos lados e atrás, até na frente havia amassados. - Mas o quê aconteceu afinal...?, se perguntava. Estava meia hora atrasada e correu como uma excelente piloto de Fórmula-1, só que infelizmente não há pilotos mulheres na categoria e ela não era nenhuma motorista de fuga nem conhecia tão bem aquela região da periferia.

Desta vez ela bateu. Perdeu tudo que havia no carro. O veículo explodiu e queimou incompreensivelmente até restarem apenas cinzas atrás daquele barranco. Ela sobreviveu porque foi arremessada sobre um depósito de colchões. Mas, apesar das leves escoriações e da dor de cabeça conseguiu ligar para um amigo taxista. Chegou ao serviço a tempo de ser demitida por não avisar o patrão.

quinta-feira, abril 25, 2013

Dor aquém

Dor aquém







Uma onda vermelha pulsa nas artérias do dia nublado
tudo parado, sem fluxo, à esguelha
da fala que insulta a alta maré

sem diária fé, só aquela das supostas emergências que se quer,
a posta insurgência é,
do buzinaço e do pouco tato de ser humano, se for algo além mutando
do lunático homem de aço

o estardalhaço prático do indivíduo egoísta
é alterado aos mil quilos pelos analistas,
aposta da choça de todos masoquistas em temperamentos

do reflexo narcisista se contorcendo,
remoendo nota do retrovisor,  para não se notar a dor dos cruzamentos.



(às 14h30, Rafael Belo, quinta-feira, 24 de abril de 2013).

terça-feira, abril 23, 2013

O individualismo fatal ao nosso alheamento


O individualismo fatal ao nosso alheamento
por Rafael Belo

Ninguém nas ruas. Melhor, quase ninguém. A frente uma moto e logo depois um carro, ambos parados em um raro retorno na Avenida Gunther Hans, mais conhecida como Marechal Deodoro aqui em Campo Grande, saída para Sidrolândia. Muito escuro. Passadas às 23h de um domingo próximo. O carro com a porta aberta arremessava objetos não identificados no canteiro central. Cena inusitada e que com certeza gera inúmeros rumos para a nossa imaginação, mas a mais insignificante seria: não tinha um lugar mais escondido para isso não?! Depois dessa vamos ao mundo virtual procurar algo a respeito e nada. São como os inconsequentes acidentes diários, os quais me recuso achar corriqueiros. Toda falta de seta para conversão, toda conversão direto da faixa do meio, toda fechada, furada de sinal vermelho, parada em cima da faixa, alta velocidade e costuras no trânsito nomeio de uma irresponsabilidade tão egoísta...

Nossa imprudência... Nossa sim, porque dê a primeira buzinada àquele que nunca foi irresponsável ao volante... “Uma” distração que só não foi fatal pelo simples motivo de sermos mais motoristas a pilotos... Aliás, é um individualismo coletivo esse nosso trânsito. Como se só um dos milhões ao volante estivesse atrasado em pleno horário de pico e esse um quase sempre seria nós mesmos únicos incomodados com o sol direto nos olhos. Veste-se o alheamento, veste-se o capacete e a única comunicação é o trajeto traçado na mente para chegar mais rápido. Acordar mais cedo ou simplesmente levantar quando o despertador toca nem pensar... É um absurdo pensar na fluidez do tráfego. Este só seria fluído se pensássemos uns nos outros, mas não. Este é um problema para os nossos representantes políticos, para as autoridades responsáveis pelo trânsito, até para o Chapolin Colorado e suas astúcias, mas nosso não. Ah, não! Nem vem... Nem me peça para olhar pelo retrovisor...

Este estar alheio nos vestiu como uma carapuça sob medida. Encomendada como traje inusitado ao videogame do piloto automático que viramos no vai e vem das marchar. Levando-nos a outro fato no trânsito, onde eu estava ao lado, foi bem além da imaginação: Chuva média. Primeiras horas da tarde. Um carro desce lentamente e de repente ao lado da janela do motorista uma briga incoerente (redundante...) se inicia. Uma motociclista invadiu a pista. Na contramão e aos gritos buzina incessantemente e esbraveja: vai passa por cima, você não é homem e acelerava a moto vai passa por cima passa passa passa, passa por cima. O condutor da caminhonete aguentou bem vários minutos, depois desviou vagarosamente e seguiu. Não contente a mulher o seguiu e foram-se à direta no cruzamento a perder de vista. Um dia de fúria versão automotiva.

Deveríamos pensar mesmo é na vida. Não me lembro à última vez de ter chegado ao serviço antes de passar por um acidente.  Assim como não lembro quantas pessoas não estão falando ao celular e com a outra mão conduzindo. O celular toca e uma vez ou outra lá vamos nós na velocidade, na inconsciência atender. Às vezes olho em volta, no sinal fechado ou durante o trajeto, e é rara a quantidade de pessoas que não estão alegres ao celular ou com a cabeça inclinada para baixo digitando mensagens de texto. Nosso imediatismo parece não ter um retorno próximo e quebramos todas as regras para depois cobrarmos bons exemplos que não damos.


O sentimento de segurança em um carro sob nosso “domínio total” é tamanho que a síndrome do super-homem segue a toda velocidade imaginando, quem sabe, uma bandeira quadriculada no fim da corrida maluca. Quantas vidas são envolvidas em um acidente por “desleixo” nosso?! Precisamos de uma revisão assim como nossos veículos e agora. E isso não seria uma cura porque não precisamos de cura e sim de prevenção. Precisamos nos prevenir desta dose homeopática de falas no lugar de silêncios e silêncios no lugar das falas, para não os transformamos em invisíveis rachas diários sem saber se o sinal no próximo cruzamento estará funcionando. 

sexta-feira, abril 19, 2013

Miniconto – Altos voos


Miniconto – Altos voos
Por Rafael Belo

Quando lhe chamaram de alienado ele logo pensou que concordavam com ele. – Não sou mesmo deste planeta. Sou um alienígena completo, tirando as antenas e a pele verde. Não concordo com quase nada e sou... Qual o nome mesmo...? Desinformado. Não só porque estou fugindo pelas sarjetas para não sumirem comigo. Sou um novo morador de rua itinerante. Mas esta acusação, alienado, veio antes desta situação. Sou formado na vida, por mais que tenha... Não tenha concluído nenhum dos cursos com a minha cara e coragem, ninguém tem o direito de me chamar de desinformado. E daí que não tenho diploma de verdade, passei pelas formações básicas (claro sem pensar e criticar muito) como todo mundo: decorando...

Ele sempre trabalhou de sol a sol, como um capacho particular. Tinha habilidades próprias e se desenvolvia com facilidade, mas nunca mostrava nada novo nem queria novidades em nenhuma parte, principalmente na política. Era detentor do clichê rouba, mas faz e também do típico melhor o certo que o duvidoso. Sempre se limitou a não correr riscos, a seguir a corrente. Dizia a si mesmo: para quê quebrar a corrente e nadar contra a maré?É tudo moda e bestice e de si para si concordava e seguia sem esforço algum, sem gastar um neurônio sequer. Mas até então, anos e anos a fio a sugar as rebarbas sobras da sociedade e de seus patrões, continuava (por incrível que pareça) o mesmo, sem deixar estas regalias farrísticas, como dizem por aí, lhe subirem a cabeça.

Porém, sabe bem a sabedoria interiorana que quem muito espera continua esperando. Começaram a encaramiolar as ideias claras do preto no branco e uma confusão começou a doer-lhe a cabeça. Pouco depois veio o surto já incendiando o mordedor no incêndio da fogueira das vaidades. Se achando no direito inalienável da arrogância decidiu fazer o impensável no país do funk, futebol, das verdades únicas e do Jornal Nacional: cobrou, cobrou e cobrou. Boicotou as eleições e sumiu na época pós-leitoral. Os agentes do politicamentecorreto o encontraram na Capital mais interiorana tupiniquim e cobraram suas justificativas. Não as tinha. Mas, armou as palavras mais usadas depois do deboche do eu te amo e as atirou Eu tenho meus direitos. Não pôde mais votar limpo, exercer nenhum de seus cargos fantamas ou funções públicas inexistentes, muito menos aprimorar seus conhecimentos em um, finalmente, terceiro grau.

Desrespeitado. Descartável. Foragido. Não posso exercer minha função oficial de capacho e sou obrigado a raciocinar sobre cada coisa. Nem mais a sarjeta é livre. Alguns dias aqui e outros acolá e lá vêm os assistentes sociais tentarem me mandar de volta como se eu não fosse da Morena. Quando foi que me tornei descartável mesmo... Ah, sim... Na hora da arrogância... Por que quis sair daquele escurinho consolador de tantos anos...? Não quis... É, não quis. Posso ver o exato momento da poda das minhas asas e do esquecimento da existência delas. Mesmo voando tão baixo sem sentir sequer o vento... Me confundi ao chão, virei chão, fiquei confuso... Só aos pulinhos bicando as mesmas velhas migalhas e aquelas ideias de cobrar meus direitos... Preciso encarar tudo agora, até olhos nos olhos, de frente olhar. Só não sei se um dia saberei voar alto...

quarta-feira, abril 17, 2013

O cheiro da Flor


O cheiro da Flor


Um sorriso democrático
para um abraço prático do cotidiano
ditando rapidamente a compreensão da vagarosa mente
da dengosa mão que afaga nos limitando

trinca de poderes se sujeitando a saudade do sujeito
do despertar da liberdade de quinta cerceada na sexta de um jeito
tão adormecido que o fim de semana vem iludido alusivo às férias

que faltam de tanto sinceras sobrar
uma ofensa a “crença” de não precisar estudar,

pois o conhecimento com carinho traz a dor
em um ninho sozinho singelo como um mero voar bajulador
confundindo paz com beijo aonde chega a flor beijar.

(às 13h25, Rafael Belo, terça-feira, 16 de abril de 2013)

segunda-feira, abril 15, 2013

Democracia com carinho


Democracia com carinho
por Rafael Belo

Já imaginou querer dar um passo, fazer um pensamento palavras altas e como um títere (ou fantoche) não pudesse porque cordas invisíveis o controlam? Há pessoas de sobra assim e elas sobram por demais e, portanto, faltam cidadãos no mundo. Esta falta é consequência da ausência real da democracia. Nossa liberdade é cerceada pela desinformação, ignorância e alienação. O maquineísmo (esta constante doutrinação que o mundo é dualista e, portanto, só existe o Bem e o Mal), e a manipulação grosseira dos acontecimentos recentes e históricos nos fazem programados ao silêncio ou incapazes de zapear e desligar a televisão. Quando não, as opções e opiniões são combatidas feito direitos não adquiridos. É o que acontece com a propaganda do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Parece-me uma ofensa.

Começa carinhoso com cafuné nas nossas cabeças, então vem à ameaça escondida de sorrisos e música: "ou você regulariza seu título de eleitor ou ficará em débito com a Justiça Eleitoral e aí não poderá exercer cargo ou função pública, renovar ou matricular-se em instituição pública de ensino e nem mais votar limpo”. Além de pagar multa e outras restrições que não citarei. Mesmo votando quando se deve (porque É um dever) não estamos em uma democracia plena (e este fato é um dos motivos). É uma democracia parcial, principalmente se levarmos em conta que os direitos da Constituição não são, em sua maioria, práticos, ou melhor, não estão em prática, ou não teríamos mais pobres, doentes, despidos, inseguros, pessoas sem moradia, desempregados, sedentos, famintos, analfabetos e pessoas sem diplomas. Se fôssemos bem instruídos desde muito cedo não haveria a cisão da política boa nem a continuação da política ruim (para ficarmos em duas qualidades apenas) e poderíamos ter o direito de não votar sem consequências, porque este posicionamento (como qualquer outro) é um ato político. A falta de filosofia, psicologia, direitos constitucionais, cidadania e ética nas escolas de Ensino Básico e Fundamental ajuda (e como ajuda) a não sermos tão críticos e práticos (e, se possível,  até teóricos - se muita base - em demasia).

Mas somos obrigados a votar em centenas de candidatos, muitas vezes, que nem nos representam de verdade... E diversos subterfúgios são feitos para isso acontecer (e como acontecem!). Se houvessem cidadãos que lutassem pelas maiorias – ditas minorias – o objetivo não seria direcionado a direitos individuais e sim coletivos. Está na nossa Constituição: “Homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações; São direitos: Saúde, educação, moradia, segurança, lazer, vestuário, alimentação e transporte são direitos dos cidadãos; Ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; Ninguém deve ser submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante; A manifestação do pensamento é livre, sendo vedado o anonimato; A liberdade de consciência e de crença é inviolável, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto. Além disso – se formos falar de religião – há o maior dos mandamentos: “Amar uns aos outro como a ti mesmo”. Mas, a preferência e a incitação do individualismo nos leva a diversas lutas separadas que no fim tem o mesmo objetivo: o direito de ir e vir. Será que não somos mais fortes juntos? Será?

Há um pedestal, ou a cobertura de uma aranha-céu, onde os que se forjaram (com nossa ajuda) detentores dos poderes visam dar certezas a sua continuidade, equilíbrio e consistência. Como deveriam ser exemplos e nossos representantes (o mesmo é reforçado aos pais, professores, donos de marcas, patentes, concessões de comunicação, marketing e proprietários de revistas e jornais e demais autoridades) misturaram (melhor, se apropriaram) dos deveres coletivos e os tornaram individuais. Nossos deveres ficaram subjulgados. Votar para escolher nossos governantes ficou a critério deles e como eles vestem tais. Cumprir as leis ficou ao nosso cabo, já que muitos deles as distorcem e até mesmo as ditam. Respeitar os direitos sociais de outras pessoas, tornou-se um mito e até uma falácia ou palavras ao vento. Educar e proteger nossos semelhantes, parece inacreditável. Proteger a natureza tornou-se “coisa”, apenas de ambientalistas. Proteger o patrimônio público e social do País, passou a ser apenas a ilógica obrigação dos governantes. Colaborar com as autoridades, bom este ficou direcionado apenas a nós, meros iludidos. 

Mesmo assim, desrespeitados, enquanto pessoas a mais e enquanto cidadãos a menos, devemos continuar a lutar pela Liberdade, principalmente de ser respeitados como pessoas, de não ter medo e não ser discriminado por causa do sexo (ou opção sexual), local de nascimento, raça, idade, trabalho, situação financeira na qual esteve, na qual está e pelos erros cometidos. Por mais que digam que não, temos sim os mesmos direitos nesta democracia inacabada cheia de pedras no caminho, nesta democracia que com carinho afaga nossa cabeça cheia de ideias para adormecê-las.

sexta-feira, abril 12, 2013

Miniconto - Tudo mais



Miniconto - Tudo mais
por Rafael Belo

Pequeno Gafanhoto acordara certo dia envolto por uma nuvem de verdadeiros gafanhotos e todos os demais verdes se foram. Público, privado, pessoal, coletivo, vivo ou morto tudo que podia ser procurado foi devorado. Nem mesmo ele havia percebido o significado daquela nuvem. Há tempos ele enxergou os gafanhotos separados. Bem, não haviam ainda se desenvolvido. Eram duas larvinhas e diversas metamorfoses solitárias depois sim, gafanhotos. Um macho e uma fêmea. Solitários por natureza como Pequeno Gafanhoto e mesmo assim agora eram aquela nuvem.

A nuvem imprevisível, e ainda inexplicável em cada uma de suas manifestações, acabou por levá-lo. Ele pensava naquele fato incomum com tanta força que os mais mentirosos juram que havia fumaça naquele vivo fogo verde. - Como tanta coisa pessoal ficou coletiva? Que força da natureza é essa que nem a natureza explica? E o mais importante: o quê eu estou fazendo aqui?! Um monte de solitários antisociais devorando pedaço por pedaço até das sombras como avestruzes e emas (bom tanto faz já que engolem tudo e tem a mesma origem) só que voadoras.

Será que vou mudar de cinco a seis vezes? Não. Um ser humano sofre metamorfoses pela vida toda... Um ano de vida...? Improvável. Mas não sou profeta. Vegetariano? Incapaz... Morreria em menos de 12 meses. Espera um pouco, que calor infernal é esse? E esse murmúrio como uma chuva de ventos cercando...? Pior é não enxergar nada além desta fumaça verde viva  e me sentir devorado. Se eu abrir a boca vou engolir... O quê? Milhares de gafanhotos? Seria como me alimentar deles desde o início da culinária chinesa, há mais de quatro mil anos e isso não significaria nada.

A língua afiada do inconsciente coletivo devorou o senso comum e uma multidão cheia de armas, principalmente medievais tochas, tentava encontrar uma maneira de incendiar aquela fumaça viva verde e nem isso interrompeu a filosofia mental do Pequeno Gafanhoto, que além do mais era incapaz de ouvir algo além do farfalhar de milhares de asas, mas mesmo assim ouvia murmúrios, vestígios distantes do pandemônio formado. Enfurecidas, nuvem e multidão, se atracaram e mal começaram a chafurdar, um helicóptero passou fazendo uma chuva de algum líquido inflamável. Em poucos instantes pensamentos e farfalhares eram reais fumaças, gritos e ódio eram cinzas, todo campo e floresta eram devastação.

Tudo mais era uma mistura de estralados silêncios.

quarta-feira, abril 10, 2013

Salvador da pátria

Salvador da pátria




Língua afiada cortando em dobro a mente fértil
inconsciente do coletivo pessoal estéril de noção
no privado público que foi- se ao chão

com a foice arranhando a louça
vinda no lugar da cara

esta, que um dia nome rosto trouxe,
louca para voltar ao animal irracional
na bagagem tosca ou na pequena mala
onde ainda guarda a forca, o salvador da pátria

como fantasia à torta da sua terapia de agonia solta
rindo a ironia à toa de ser uma castrada sátira.

(às 17h22, Rafael Belo, terça-feira, 9 de abril de 2013).

segunda-feira, abril 08, 2013

Trocando as vogais do convívio


Trocando as vogais do convívio

por Rafael Belo


Guerra! Balas, trocação, sangue... As pequenas lutas forçosas criadas. O cultivo do ódio, a confusão mental e física. Há uma cisão entre o público e o privado clara (e necessária), mas a nitidez se desfoca quando o particular e o coletivo se agridem em campo aberto e se fundem. Nesta batalha campal vazia e, portanto, desnecessária só acontece descarregamentos de variadas munições com tamanha energia desperdiçada que os choques terminam em uma hecatombe pessoal ou, no lugar-comum, o famoso tiro no pé.

Armas carregadas e apesar da mira, hora na cabeça hora no coração, os tiros sempre são para o alto. Covardia? Sim. Porque de fato não importa o alvo, importa tê-lo e guerrear a agitação. Mas antes da covardia contra o outro, é pessoal. Coletivizar é uma estratégia malograda de dispersão. É como um espião espionando a si mesmo. A guarda sempre alta com as mãos no rosto tão acima do necessário que nada é possível enxergar. As portas se fecham e mesmo assim o sangue escorre.

Para cultivar pessoas e, consequentemente, amizades é preciso o desarmamento imediato. Descruzar os braços, abrir os sorrisos, cumprimentar as pessoas, olhar nos olhos e saber que todos merecem um tratamento normal. Porque, além do mais, confiar é uma conquista diária e frágil a ponto de vir em garrafais letras vermelhas ESTE LADO PARA CIMA ou você revela seu pessoal para o coletivo? Ser sincero, mas pensar antes de cultivar o veneno e os duplos fios de corte preciso. O inimigo é o outro? Não somos nós mesmos e nossa guerrilha interna resvala no profissional em uma troca sem igualdade.

Trocando o "u" pelo "o", a extensão se torna cumprimento e o comprimento um fraco aperto de mão . Esta medida fica desmedida quando ao invés da simpatia ou a tentativa de, acontece o percorrer do olhar pelo outro, a desarmonia geral e, enfim, esta constante guerrilha pessoal e a guerra civil profissional. E, pessoalmente, só podemos dizer que esta confusão cria uma falsa separação entre o físico e o intelectual mesmo sabendo que todo este armistício é um batalha sem fim de cultivo de ilusões analisadas onde o convívio consigo mesmo torna-se pior "do que" com o outro.

sexta-feira, abril 05, 2013

Miniconto - Livrai-me



Miniconto - Livrai-me
por Rafael Belo

Ele sentia o gosto doce de sangue e começava a saboreá-lo, mas desta vez havia algo salgado e até amargo. Claro, sua memória estava intacta e o acusava do feito da última noite. Por mais luta empenhada demonstrada, só ele sabia o quanto de lamento o preenchia. Balançando a cabeça inconsolavelmente ele repetia no meio de sua incompreensão: - Por quê? Por quê? Como fui capaz desta autotraição, fake de autorevelação. Eu? HERÓI? Não, livrai-me...

Lamento ter salvo aquela vida. Meu instinto traiçoeiro se rebelou e quando percebi o quarto (mau?) elemento caia. Nem dei conta deste corte interno na boca. Desde quando me importo com uma garota recém trocando calcinha ainda cheirando achocolatado com leite. PÔ MEU... FAÇA-ME O FAVOR. Agora toda essa marra vou ter de manter. Porque uma jornalista precisava estar naquela confusão... AH MALDITOS SMARTPHONES! Quanto silêncio aqueles sacanas vão manter?

Até dias atrás, ele atuava com o bando. Mas, nunca concordou com os estupros. Nunca foi bom, aliás de bonzinho não tinha nada e isso o perturbava porque ele não derrubou “seus” antigos caras para ter vantagem. Estava inconformado e reconheceu a jornalista no beco seguindo a novinha, só não sabia o motivo e nem porque ele acabara por decidir passar pela região de antiga atuação. Agora que estava sozinho... - Não adianta reclamar em carreira solo, repetia para si enquanto acessava os sites de notícias.

Pelo menos o sangue volta a ficar doce... humm... Muito escuras essas fotos. Nem os caras, nem a vítima, nem a tendenciosa jornalista podem me identificar. “Fui rápido demais”, diz aqui. OK! Espero que não me procurem pelos Dojos da cidade, nem pelas salas de professores ditadores por aí. Adoro que saibam o quanto detestável sou e do tanto capaz, mas como viveria se descobrissem este... Este... ESTE maldito instinto de se meter na vida dos outros? Não quero ficar aliviado por uma (boa?) ação e alguém lá sabe o que é BOM?! Ah, LIVRAI-ME DE MIM!!

quarta-feira, abril 03, 2013

Inconfidências

Inconfidências


Mensurando a mentira interna externa a imagem adestrada
cadastrada no desequilíbrio do brilho malévolo do médico/monstro
posto a sério no mistério da névoa dos rostos

impropério ao sincero olhar moroso
no malicioso gosto das diversas dualidades drásticas
do jeito de interpretar as lástimas

bipolaridades múltiplas de multidões no exílio
sem o martírio de permanecer fora do ar

faceta esbofeteada na sarjeta de estar
no mínimo na negação de se autoconfidenciar .


(às 20h49, Rafael Belo, 2 de abril de 2013, terça-feira)

segunda-feira, abril 01, 2013

No estranho primeiro de abril dos médicos e monstro

No estranho primeiro de abril dos médicos e monstros
por Rafael Belo
Se ele é aquele que se esconde, eu serei aquele que procura. E se ele e eu fôssemos a mesma pessoa? Este antigo trecho é de 1886, do Estranho caso do Dr. Jekyll and Mr. Hyde de Robert Louis Stevenson ou, como conhecemos a obra, O médico e o monstro. Temos nossos médicos e monstros dentro de nós e dependendo do nosso equilíbrio particular tendemos mais a uns. Dentro de nós, seres humanos, não há o bom puro ou um mal destilado, há nosso crescimento e decisões. Somos aquele que esconde e aquele que procura. Mas, às vezes nos escondemos tanto, a ponto de não sabermos qual é qual, porque, afinal, ambos somos nós e queremos que tudo seja simples dividido por lados: mocinhos e bandidos.
Este clássico é baseado na vida dupla de um escocês de Edimburgo: William Brodie. William roubava as casas dos moradores da cidade à noite e durante o dia era um respeitado marceneiro. Como sempre não é tão simples na realidade. Esta suposta dicotomia vive dentro de nós sem tanta obscuridade, mas com muito eufemismo e metonímia. Regrados por leis, éticas e moral, a vida acaba por ser uma constante vigilância e autovigilância. Suprimimos e reprimimos muitos desejos e vontades por "n" objetivos e nossa mente guarda, nosso corpo armazena, nosso coração sobrecarrega e nossa alma amplifica. Somos instintivos e sensitivos como os animais, mas somos mais racionais e neste primeiro de abril podemos dizer que muitas vezes, nós somos a maior mentira.
Nesta data, seguimos a tradição de “pregar trotes” porque hoje foi um dia o início do ano até Júlio César mudar para primeiro de janeiro meio século antes de Cristo, por questões políticas. Década depois o papa Gregório XIII estendeu a data para toda cristandade e o calendário gregoriano foi difundido para todo o mundo.  E não há troca de presentes falsos para troçar dos desobedientes que continuram há séculos a comemorar a data como verdadeira ou o “peixe de Abril”. “Peixe de Abril” marca o fim da Quaresma (consumo proibido de carne vermelha para cristão e a data que marca a morte e ressurreição de Cristo) e onde o peixe é o presente mais frequente. Assim, dia primeiro de abril é dia daqueles que não aceitam a realidade ou a querem de outra forma.
Assim, distorcemos nossa visão, inventamos outra e não aceitamos muito do que não venha de nós. Talvez tenhamos três naturezas em luta constante para ser livre: a humana, a demoníaca e a divina. Podemos ser fusões, mas somos mais pelo cotidiano, pelo vivido por nós, por onde crescemos, onde trabalhamos, pelos outros e pelas diversas culturas que absorvemos. Não somos uma coisa ou outra, apenas não aceitamos a realidade, a queremos de outra forma e criamos mecanismos onde somos médicos ou monstros. Dr. Jekyll acreditava que o problema era quando o lado negativo se libertava e ia parar nos noticiários. Acredito que o problema é quando guardamos só para os silêncios nossas impressões, sentimentos e acumulamos energia ao invés de compartilhá-la, de distribuí-la e não vir a conhecimento público de jeito algum ou muito tarde. Tudo isso vira ressentimento e, uma hora, quem está escondido dá as caras.
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“...dentro de meia hora, irei novamente e definitivamente incorporar aquela odiosa personalidade, e antevejo com irei sentar tremendo e chorando em minha cadeira, ou continuar, com o mais desgastado e apavorado êxtase auditivo, a andar de cima para baixo neste quarto (meu último refúgio terreno) e atentar a qualquer som de ameaça.” (Trecho de O Estranho caso de Dr. Jekyll and Mr. Hyde, ou o Médico e o Monstro).
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