sábado, junho 15, 2013

(Miniconto) Invasores

(Miniconto) Invasores
por Rafael Belo

Estava tudo vazio e destruído. Vestígios de uma guerra declarada. Haviam algumas brasas espalhadas por diversos pontos e uma leve brisa começou as espalhar as cinzas. Distantes daquelas ruínas modernas dois grupos falavam de terras, propriedades, um de frente para o outro. Se um viajante do passado ou do futuro surgisse certamente duvidaria ter se deslocado pelo tempo. Poderia muito bem estar há 500, mil ou três mil anos ou então ter avançado para daqui a 600, 1,2 mil ou cinco mil anos.

Aos poucos o vento imperceptivelmente aumentava e o fogo falso morto se atiçou. As brasas já eram um incontrolável incêndio. Os gritos dos grupos eram tão fortes a ponto de abafar aquele consumo desenfreado do fogo. Aquele conflito sem fim entre os eternos colonizadores e colonizados não permitiu ninguém perceber o cerco do perigo. Quando o ar se esvaiu e as tosses dominaram os grupos. O fogo mandava, habitava e terminava de destruir aquelas terras.

Em poucos minutos todos pareciam iguais. Suor e cinzas eram a cor da pele, o tipo de cabelo e a cor dos olhos. Respirar era necessário, mas queimava como se o ar fosse fogo. A pele ardia como se o suor fosse álcool. De súbito todos começaram a se mover lentamente. Tiraram as camisas, aqueles que as usavam. Tiraram as calças e sincronicamente chegaram até um antigo poço ao lado de um depósito de pedras feito à mão. Não tinham muito tempo.

Silenciosamente se molharam, molharam os panos que rasgavam e enrolavam na cabeça deixando apenas os olhos de fora. Enquanto outro grupo pegava a ferramenta que encontrava e sulcava o chão sentindo os pêlos expostos queimarem. Durante horas de desmaios e chacolejos para despertar, água e terra eram atiradas ao fogo que lutou muito, mas não resistiu.


Feito o trabalho, cada um tentou "desmisturar" do outro grupo. Estavam exaustos. Não conseguiram a proeza. Ao invés disso, foram cedendo ao cansaço e caíram como estavam. Acordaram com gritos de ordem e papéis de ordem judicial de desocupação. Não se sabe aonde arrumaram tantos camburões. Mas, couberam todos. Todos misturados, sem documentos e sem argumentos de que não eram invasores. Eram só suor e cinza. Eram apenas invasores e estavam encarcerados.

Um comentário:

Anônimo disse...

Texto magnifico! Os invasores de nossas vidas estão por ai...querendo silenciar...serem donos da verdade...nesse texto podemos ver muitas situações do nosso cotidiano! Parabéns! mays