segunda-feira, novembro 24, 2014

Perdendo a cor – Rafael Belo

Pétalas amarelas são perfeitas até na imperfeição. Juntas formam a flor e o perfume contrastando com o verde como um desmaio de olhos abertos. É um sair de si e ser outra pétala desta mesma primavera neste botão aberto. Sair de si e ser outras possibilidades é se dar a liberdade de imaginar e poder ser todos os seus dons. Perder o tom e desafinar a vida é um caminho a ser percorrido.

Como saber a afinação e o dom sem sabermos a desafinação e aquilo com o qual não temos afinidade? Perdoar-se e o outro pode variar entre o grave e o agudo, mas deixar a ignorância ganhar nuances de drama é perder por desistência ou simples ausência. Não podemos vestir este traje da depressão, vale mais o desapego. Temos de estender a mão e nos despir de preconceitos.

Mas ficar nu e ostentar a magreza com adornos de adoradores do corpo malhado é aquela velha história de chover no molhado, de usar flores para disfarçar o cheiro de decomposição. Talvez da nossa consciência iludida, dos nossos óculos corretores da miopia e do astigmatismo, mas com lentes da fantasia. Usando da brincadeira e da ironia, ou melhor sarcasmo, para humilhar e ofender dizendo com outras palavras o que queria dizer.


Proporcionando dor em si e no próximo é se despetalar, desbotar e acelerar a própria decomposição. Sem cor e sem odor a vida vai ficando sem graça e realmente começa a doer. Não podemos ignorar a dor alheia, mas precisamos acabar com nossa dor, encontrar nossas cores originais e saber mudar de pétala se preciso for. Então, nossas mãos se estendem naturalmente até parar de doer.

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