quarta-feira, novembro 08, 2017

A jogada (miniconto)





por Rafael Belo

Havia admiradores por toda parte. Eu não sabia. Ninguém curtia nada dos meus posts, ninguém comentava... Ninguém falava. Como eu iria saber? Sempre me considerei linda acima dos padrões, mas só atraia gente vazia... Não fuçava o perfil de ninguém... Falo muito ninguém, né?! É porque eu me considero ninguém. Não é baixa autoestima. Eu sou alguém muito importante... Para mim! Você me entende. Eu sei! Que horror ser vigiada o tempo todo, imitada, ser... É difícil para mim dizer esta palavra, mas ok. Inspiração.

Sou inspiração de tanta gente... Quer dizer que eu não posso fazer nada fora do esperado, se eu cometer um erro serei cobrada pela eternidade... Não acho isso admirável. Por favor, não me admirem! Gostaria que me esquecessem, mas quando isso acontece eu fico depressiva... Sinto-me abandonada. Seriam sintomas de abstinência? Alguém pode criar os Inspiradores Anônimos? Meu Deus! Não quero esta responsabilidade, não. Tenho medir tudo sempre. É tão exaustivo.

Quanta reclamação... Nasci reclamona mesmo. Deveria ser grata por ser percebida e as pessoas me verem como referência, mas não sou assim. Não vou me obrigar a me sentir agradecida. Só porque eu sou autêntica no meio de tanta xérox mal feita e pessoas copiadas? Cópias me parecem vazias e de vazio basta este mundo superpopuloso. Eu deveria mesmo pensar em ser ferramenta do outro para ele se sentir melhor? E os meus sentimentos? Isso não é egoísmo é motivo de tantas más decisões...

Tomo tantas más decisões que esta deve ser mais uma diante das minhas coleções de ressacas só de hoje. Mas, não me importo... Como posso ser inspiração, referência, se estou eu precisando disso? Será que...? Estas minhas graves falhas me humanizam? É isso? Estou mais próximo daqueles por trás de tantas cópias de máscaras e até por trás destas máscaras? Bom, já perceberam ter sido tudo programado, né? Meus últimos posts, incluindo este meu vídeo... Agora espero estar indetectável. Ah, não tentem repetir isso ou me seguir.


Realmente ninguém sabia quem ela era até ela decidir sumir. As pessoas não passaram a sumir também, mas começaram a prestar mais atenção nas más-ações que insistiam em repetir.

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